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EM ENTREVISTA

Rafael Menin: SAF no Galo, venda de shopping, dívidas e custos da Arena MRV

'Nossa ideia com a venda da outra metade do Diamond Mall seria para debelar grande parte desse débito'

22/04/2022 08h55
Por: Redação

Por Itasat

O vice-presidente do Conselho Deliberativo do Atlético, Rafael Menin, foi o entrevistado do programa Bastidores, da Itatiaia, nesta quinta-feira. Durante o bate-papo, foram abordados diversos assuntos, como os estudos para implantação de uma Sociedade Anônima do Futebol (SAF) no clube, o crescimento da dívida por conta dos juros, as conversas para a venda do shopping Diamond Mall, o aumento dos custos das obras da Arena MRV e quando o estádio ficará pronto. 

Confira abaixo a entrevista completa com Rafael Menin: 

SAF do Atlético 

A gente acha que a SAF pode ser um caminho, mas obviamente é um tema sensível e que tem que ser muito bem debatido pelo Conselho do clube e pela torcida. A gente acha que uma SAF feita sem correria, com planejamento, com discussão, pode ser benéfica para o clube a longo prazo. O que a gente não pode fazer em um projeto dessa importância, é ser de forma açodada, sem analisar todos os aspectos positivos e negativos. Tudo na vida tem pontos negativos e positivos 

A nossa ideia é trabalhar bastante nos próximos meses, estudar o que foi feito em outros países. Fora do Brasil, no futebol europeu praticamente todos os clubes são SAFs, são clubes-empresa, em cada país tem um nome. A nossa ideia é olhar o histórico em Portugal, Espanha, Inglaterra e no próprio Brasil. Ver o que deu certo, o que deu errado. Obviamente usaremos uma empresa para nos apoiar nessa discussão. Quando tivermos um material bastante completo, a gente submete ao Conselho, que vai avaliar se está no momento certo, se o modelo apresentado é correto. É um tema importante, que pode ajudar o clube.  

Inicialmente, na SAF, você tem um ingresso de capital importante, isso ajuda. Mas a governança, como será a gestão, os objetivos futuros do clube. Tem, muita coisa para ser discutida, avaliada antes de ser definida se o clube em algum momento se tornará uma SAF ou não. Gostaria de deixar sempre a torcida tranquila. Se, por ventura, a SAF for feita no Atlético ela será feita com calma, análise e envolvimento do máximo de pessoas possíveis para fazer um projeto bacana, caso essa seja a decisão do Conselho. 

Boa gestão no Galo 

Tanto eu quanto meu o pai [Rubens Menin], o Ricardo [Guimarães] e o Renato [Salvador], a gente tem participado nos últimos dois anos de forma mais ativa. Mas é um grupo de pessoas muito maior. Temos o nosso presidente que tem feito um trabalho espetacular, o Sérgio [Coelho, presidente] é uma pessoa magnífica, seríssima, muito trabalhadora. O doutor José Murilo Procópio [vice-presidente], nossos diretores. O Atlético tem um time muito bacana, de pessoas sérias, dedicadas, que olham muito mais para o clube do que para o próprio umbigo.  

Há muito desprendimento, união, muito diálogo e acho que esse é um dos segredos do Atlético atual. O futebol é muito complexo, tem muitas nuances. Não é só o campo. Tem o aspecto esportivo, que é muito importante, mas tem o aspecto administrativo. Quando você tem um grupo de pessoas de muito bom nível, diretores que são remunerados pelo clube. Temos lá o Leandro [Figueiredo, diretor de negócios], o André [Lamounier, diretor de comunicação], o Rodrigo Caetano [diretor de futebol]. 

Enfim, é uma turma muito bacana, muito qualificada. O Atlético hoje já é gerido como se fosse uma empresa, cada vez mais profissional. E se, por ventura, em algum momento a SAF acontecer no Atlético, isso vai permanecer. Talvez, o maior legado que a gente quer deixar, é mostrar que a organização, o planejamento, a boa gestão reflete no campo também. O futebol não pode ser o acaso. A gente já viu no passado alguns clubes ganharem título esporádico e depois passarem por momento muito difíceis. O que a gente quer fazer daqui para frente é que o Atlético sempre tenha um time competitivo, seja sempre bem gerido via SAF ou não, com pessoas comprometidas, sérias e dedicadas. Esse é o modelo que a gente acredita e tenta colocar em prática no Galo. 

O que o Galo precisa fazer para sair na frente de Palmeiras e Flamengo

Sem entrar no mérito se foi bem feito ou mal feito (SAF de outros clubes). A gente vem tendo contato com o Ronaldo, com o time do Ronaldo, um pessoal muito bacana, muito bem intencionado. Acho que vão fazer um trabalho que, obviamente, não é de curto prazo, é de longo prazo, vão fazer um trabalho muito bem feito no Cruzeiro. O processo do Botafogo, aparentemente, a turma que está lá é muito qualificada, tem feito investimentos em outros clubes. Já o fundo que entrou no Vasco a gente conhece muito pouco, não dá para avaliar a priori, tem que esperar um pouco mais. 

Em relação ao Flamengo e Palmeiras, ambos os clubes tem uma situação financeira muito melhor do que a do Galo. O Flamengo começou sua reorganização em 2012, com o (Eduardo) Bandeira, que foi um presidente muito qualificado. Estive com ele algumas vezes, pessoa muito séria, humilde, pé no chão, que fez um trabalho muito bem feito no Flamengo por dois mandatos. O Palmeiras começou esse trabalho em 2014 na gestão do Paulo Nobre, também fez um trabalho muito bem feito. 

O Galo está alguns anos atrás desses dois clubes. Então, em função disso, temos uma situação financeira mais frágil do que Flamengo e Palmeiras. Hoje o futebol não tem muito mistério. Se você não tiver uma receita disponível grande, para poder ter bons atletas, uma boa categoria de base, eventualmente contratar alguns talentos que você tem nas categorias de base, dificilmente você será competitivo. Como eu disse antes, você pode ter um ano que tudo dá muito certo, você terá um bom desempenho esportivo. No ano seguinte você tem um desempenho esportivo mediano ou ruim. Mas, para perpetuar e ter um bom desempenho esportivo perene, competir por todos os títulos, é fundamental ter uma capacidade de investimento elevada.  

Hoje o Atlético tem feito um esforço gigantesco para competir com esses dois clubes (Palmeiras e Flamengo), mas certamente a nossa situação é muito mais dura do que a desses dois clubes. Tem movimentos que a gente acha que se forem feitos ao longo dos próximos meses, a gente consegue de alguma forma ir equiparando essa capacidade de investimento. Isso nos permitirá manter uma possibilidade de competir com esses dois clubes, não só como foi em 2021, mas será em 2022. Mas, olhando para frente nos próximos anos. O Galo quer estar entre os três, quatro clubes mais competitivos do Brasil e da América do Sul por muitos anos. 

Custos da Arena MRV aumentou

São coisas distintas. A gente vendeu a primeira metade do shopping, que foi fundamental para a gente começar a Arena. De fato, a Arena MRV, quando a gente apresentou o conceito dela para o Conselho do clube, ela tinha um orçamento de R$ 410 milhões à época. Isso foi em 2017, se não estou enganado. E de lá para cá os custos aumentaram muito. Além disso a gente teve o processo de licenciamento. Foi imputado à Arena, se eu não me engano, 108 contrapartidas. E não só contrapartidas viárias, mas ambientais na região do entorno da Arena. Enfim, são 'n' contrapartidas em outras regiões da cidade, inclusive. O número que a gente não previa.  

A gente olhou outras arenas que foram feitas na época da Copa do Mundo de 2014 e a maior delas não tiveram, ou tiveram contrapartida muito reduzidas. Em alguns casos as prefeituras ou governos estaduais aportaram dinheiro no projeto para incentivar. Dado que é um equipamento público, de interesse para comunidade como um todo. Já no caso da Arena MRV, de fato, a gente passou por um processo de licenciamento mais duro e o custo atualizado dessas contrapartidas está em torno de R$ 200 milhões, valor atualizado. Além disso, a Arena que foi orçada em R$ 410 milhões, está com essa atualização, subida de insumos nos últimos dois anos, principalmente. O aço mais que dobrou de valor, o concreto quase que dobrou de valor. A Arena está um pouco acima de R$ 600 milhões.  

A grande surpresa foi essas cento e poucas contrapartidas. Isso não está vinculado à venda da outra metade do Diamond Mall. O que a gente está fazendo é vender mais propriedades comerciais. Então, aproximadamente 10 mil cadeiras da Arena serão vendidas, nós já vendemos 6.500, 7 mil cadeiras. Faltam vender aproximadamente três mil cadeiras. E com a venda dessas cadeiras, naming rights, alimentação e bebida, estacionamento e outras propriedades comerciais, a gente consegue fechar a equação da Arena.  

Quando a Arena MRV ficará pronta? 

A Arena ficará pronta no final do ano. A gente teve que fazer um esforço comercial muito maior, que obviamente vai refletir após a conclusão em uma receita um pouco menor. A gente esperava vender aproximadamente 4.500 cadeiras, e estamos tendo que vender dez mil cadeiras. Estão esses 5.500 assentos a menos, além de outras propriedades comerciais, reduzirá a receita potencial da Arena em aproximadamente R$ 25, R$ 30 milhões por ano. Mas, o importante é que a Arena ficará pronta.  

A obra civil fica pronta no fim do ano, e ainda vão ter a parte de licenciamento final, o entorno da arena que vai até março. O atleticano que passar na Via Expressa no fim do ano, perto do Natal, verá nossa casa 100% pronta. Ano que vem, a partir de abril, vamos dar o pontapé inicial, e jogar dentro da nossa casa, o maior caldeirão do Brasil, a Arena mais moderna e mais bonita do Brasil. 

Galo vai vender o shopping Diamond Mall? 

A segunda metade do Diamond Mall está muito mais ligada à dívida do clube. Não é segredo para ninguém que o Galo hoje tem uma dívida de R$ 1,2 bilhão. Parte dessa dívida é benigna, uma dívida com os apoiadores, com o Profut. Isso representa 40%, 50% da dívida. O restante são as dívidas onerosas, com bancos, dívidas com fornecedores, dívidas com agentes. Essas dívidas, grande parte delas, tem correções financeiras.  

Em 2021, por exemplos, o Galo gastou quase R$ 80 milhões com juros. Para a gente expandir o universo de tempo. O Galo entre 2011 e 2021 gastou mais de R$ 500 milhões com juros. Número maluco. Se a gente imaginar esses R$ 80 milhões por ano, são R$ 6,5 milhões por mês. Isso é o salário de cinco atletas de altíssimo nível. A gente deixa de poder contratar atletas, ter um time ainda mais forte, porque temos que pagar esse encargo todo mês.  

A nossa ideia com a venda da outra metade do Diamond Mall seria para debelar uma grande parte dessa dívida onerosa e com isso o Atlético ter uma vida financeira muito mais tranquila do que tem hoje. O Galo tem problema financeiro há décadas, mas ele nunca foi atacado de forma corajosa é uma palavra forte, mas nunca foi priorizado essa solução financeira do clube. Então, é uma bola de neve que vem crescendo a cada ano, e chega um momento que a dívida passa a inviabilizar o clube. E certamente se a gente não resolver o aspecto financeiro, essa dívida muito grande, a gente não vai conseguir competir com Flamengo, Palmeiras ou outro clube que tiver boa situação para contratar atletas ou ter time competitivo.  

Nas competições grandes você tem que ter 20 atletas muito bons. E hoje não se faz um time de futebol gastando menos de R$ 300 milhões por ano. Fora comissão técnica, despesas administrativas, impostos. Um clube como o Atlético hoje, se a gente computar todas essas despesas, ele custa quase R$ 500 milhões por ano. Se a gente conseguir debelar esses R$ 80 milhões de juros, que é crescente, certamente a gente poderá ter um time cada vez mais competitivo e estar disputando as principais competições no Brasil e sul-americano. A gente quer de fato estar no topo da América do Sul no que diz respeito ao futebol. E não dá para estar lá se a gente não tiver com a nossa situação organizada. 

Liga do futebol brasileiro 

O Sérgio [Coelho] é um cara muito habilidoso, muito pé no chão, humilde. Ele tem feito um trabalho muito bem feito, procurado conversar com todos os clubes da Série A. O Galo pode sim ajudar a aglutinar esses grupos que já existem. A Liga nunca esteve tão próxima. Os clubes hoje entendem que a Liga será de grande importância para termos um futebol brasileiro que possa competir em algum momento com o futebol europeu. Isso é totalmente possível.  

No Brasil a gente competia há 20, 30 anos com qualquer clube europeu. Essa distância aumentou por que as ligas europeias tem muito mais dinheiro do que o nosso campeonato. Isso aconteceu por que de fato lá tem muito mais organização, a centralização da venda das propriedades comerciais. Os clubes brasileiros depois de muito tempo, cada um escolhendo muito pelo seu próprio umbigo. 

Hoje tem mais convergência pelo modelo da liga, como ela deve funcionar, como deve ser estruturada. Sou muito otimista com a formação da Liga em 2022, e certamente o Galo terá um papel importante na constituição da liga. Na figura do nosso presidente que tem feito um trabalho de liga para um, liga para outro, se reúne pessoalmente com clube, com outro. A gente tem procurado ajudar e acelerar a formação da tão sonhada liga. 

Consenso pela Liga 

O que aconteceu lá fora? Se cada um preocupar com sua fatia do bolo, não tem liga. A preocupação tem que ser como aumentar o bolo. A gente cita o exemplo da Premier League, que foi a primeira liga constituída nos países europeus, lá foi exatamente isso. Os grandes clubes entenderam que se eles cedessem um pouco para os clubes menores e reduzissem a diferença, o futebol inglês seria muito mais competitivo, o produto seria muito melhor e o bolo cresceria. Dito e feito.  

Hoje um clube intermediário na Premier League tem uma receita de R$ 250 milhões de libras. Esse clube consegue competir, não que vá ganhar o campeonato, mas vai jogar de forma muito parelha com o Tottenham, Manchester United. Talvez não ganhe do Manchester City ou do Liverpool, mas vai engrossar o jogo com esses clubes todos.  

A gente vê hoje a Premier League, o maior case de sucesso, e ela só aconteceu por que foi feito um trabalho olhando a longo prazo e como crescer o bolo a cada ano. Hoje há, depois de muito tempo, esse entendimento no futebol brasileiro, que dá para crescer bastante o bolo no Brasil. E lá na frente todo mundo vai ganhar muito mais do que ganha hoje, com uma diferença menor com o clube que mais ganha e o que menos ganha. 

Pagar dívidas com a venda do shopping 

A matemática é simples. O Galo recebe atualmente por volta de R$ 7 milhões por ano com o contrato de arrendamento do Diamond Mall. A partir de 2030, o Galo passa a ter 50% da receita líquida do shopping. Essa receita líquida atualmente é por volta de R$ 50 milhões. Então, em 2030 o Galo passará, caso continue com o shopping, a receber R$ 25 milhões. Hoje, a gente recebe R$ 7 milhões, e daqui oito anos a gente passará a receber por volta de R$ 25 milhões 

O shopping, se entrar no mérito da venda, a gente acha muito possível reduzir a dívida do clube em mais de R$ 400 milhões. Essa dívida nos custa hoje, se a gente pegar a Selic de 11% mais o que o banco cobra acima da Selic, ela nos custa R$ 60 milhões por ano. A matemática é, ou a gente recebe R$ 7, e vamos receber R$ 25 milhões lá em 2030. E caso o Conselho entenda que o shopping tenha que ser vendido, a gente deixará de pagar esses R$ 60 milhões por ano. São R$ 7 milhões, lá na frente R$ 25 milhões, contra R$ 50 milhões, R$ 60 milhões por ano (de juros).  

Matematicamente falando, manter o Diamond Mall, que é um belo de um patrimônio, muito importante na história do clube. Mas, manter o Diamond Mall, o Galo sendo dono daqui para frente, financeiramente não faz nenhum sentido. Mas essa é uma escolha do Conselho que tem que avaliar não só o aspecto financeiro. De repente o Conselho acha que é importante o Galo ter um shopping. E, obviamente, tendo um shopping, essa diferença dos juros em relação ao que recebe, claro que a gente não vai ter a mesma capacidade de investimento no futebol, isso é matemático.  

Se o Conselho entender que é mais importante a gente continuar com 50% do shopping em vez de ter um pouco mais de capacidade, ou muito mais capacidade de investir no futebol, o Conselho é soberano. Eu como conselheiro e atleticano, é a minha opinião, não tem muito sentido a gente continuar sendo dono de shopping, já que nosso propósito é jogar futebol, ganhar título e ser competitivo no futebol. 

Ganhos com a venda do Shopping 

No nível atual de Selic, se a gente debelar R$ 400 milhões de dívida de forma imediata, os juros caem R$ 50 milhões. Em oito anos, a gente está falando de R$ 50 milhões vezes oito, R$ 400 milhões. Acaba virando uma transação de R$ 800 milhões. É muito dinheiro. Como família, a gente fez um esforço muito grande nos anos de 2020 e 2021, para fazer essa transição por um Atlético sustentável, competitivo, contratando atletas caros e de muito bom nível. Mas, daqui para frente o Atlético tem que caminhar com as próprias pernas. Digo que o Conselho tem uma decisão muito importante para ser tomada em 2022. E, na minha opinião, caso o Conselho opte pela venda do Diamond Mall, o clube continuará sendo da primeira prateleira, que conseguirá continuar brigando com os dois, três clubes que terão mais receitas e que estarão lá em cima. Se a gente não vender o Diamond Mall, claro que a situação ficará mais dura.  

Os estudos estão muito avançados (para a venda do Diamond Mall), isso deve ser discutido ao longo do mês de maio. Mas, ainda não temos uma data para votação. Acho que no primeiro semestre é possível que o Conselho avalie o tema, e opte pela venda ou não.  

É importante que, caso o Conselho entenda que a venda tem que ser feita, vai ter uma empresa auditando, que vai controlar todo o recebimento dessa venda, para de fato a venda ser usada para debelar dívida, e não para trazer um atacante. O atacante você traz no outro ano pagando menos juros. De cara, a gestão do recurso será integralmente para pagar dívida. E que fique claro que a dívida com nossa família, ela não será paga. É uma dívida que não tem prazo para ser paga, é a última dívida da fila, que não tem juros e que não será paga com recurso com a venda do Diamond Mall. Só a dívida onerosa que sobrecarrega o clube há tantos anos.