Os Arturos, comunidade quilombola situada no bairro Jardim Vera Cruz, em Contagem, realizam no dia de hoje uma de suas mais tradicionais celebrações, que remetem aos tempos da escravidão. Segundo a lenda, se até a passagem do dia 23 para 24 de dezembro o escravo não capinasse sua roça, o “João do Mato” ali amarrava seu cavalo e era o sinal de que aquele era um “escravo preguiçoso” e nada ali prosperaria, explica o atual patriarca da comunidade “seu” Mário Braz da Luz, de 86 anos. O simbolismo da solidariedade entre os escravos se revela no mutirão reunindo homens e mulheres que seguem em direção aos roçados, com suas foices e enxadas, entoando cânticos de sofrimento e libertação, para que nenhum roça fique submetido ao “João do Mato”.
O rito agrário que consiste na expulsão do João-do-mato, que é símbolo com características humanas da vegetação que nasce sem ser semeada (erva daninha) e deve ser destruída. Nesse rito os capinadores vão realizando seu trabalho em mutirão, entoando as cantigas alegres ou os lamentos da vida diária - numa lembrança dos tempos de cativeiro. O João-do-mato aparece quando a capina vai chegando ao final. Com as enxadas levantadas, os capinadores entoam a cantiga de expulsão: o João-do-mato passa entre as enxadas e sai das terras capinadas em busca de área em que o serviço do homem não interferiu na natureza. O rito configura o valor da enxada no trabalho e sobre o mal sobre a preguiça, mantendo o ciclo da vida como um rito de constante renovação.
O ritual foi conduzido pelo patriarca da comunidade “seu” Mário, que neste ano assumiu a tradição em uma cadeira de rodas e está se recuperando de grave problema de saúde que o levou por algumas semanas ao CTI do hospital municipal de Contagem.