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Discriminação

'Nos fazem sentir como lixo', diz advogada negra que denuncia injúria racial e agressão em Contagem

Além das agressões verbais, a advogada teria sido agredida com tapas e ameaçada

04/09/2020 10h44
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Por Itasat

"Já ando com a minha carteirinha não mão. Ninguém acredita que uma preta possa ser advogada". O relato é de Kelly Cristina de Oliveira, advogada, de 41 anos, que por vezes lida com o inadmissível: o racismo. Para a própria segurança, ela precisa provar que exerce a profissão.

Nessa última terça-feira (1), afirma Kelly, ela trabalhava quando sofreu agressões ataques racistas em Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. O suspeito é um homem que teria discutido com o cliente da advogada por causa de um lote no bairro Estâncias Imperiais.

Dentre os xingamentos, relata, ela ouviu que não passava de uma "negrinha, comedora de feijão cru". Além das agressões verbais, a advogada teria sido levado tapas e recebido ameaças de um policial penal que estava armado e que foi chamado para o local pelo outro suspeito. À Polícia Militar, ambos negaram ter cometido os crimes.

Frequente

Situações como essas, infelizmente, já são conhecidas por Kelly, e pela maioria da população negra no Brasil. Em entrevista à Itatiaia, a advogada contou sobre sua trajetória.

"É revoltante como isso [o racismo] é comum. Nos fazem sentir como lixo, como se a gente não fosse nada. Só enxergam sua cor. A sensação é que todos os anos que estudei, que batalhei, não valeram nada para eles. Pra nós, que somos mulheres e negras, esses dois fatores são usados pra diminuir a gente", afirma.

"Durante minha faculdade, eu era a única negra da sala. No trabalho, já ando com minha carteirinha da OAB na mão, porque não acreditam que uma negra possa ser advogada. Tenho que provar sempre pra todos o que sou", completa.

Impunidade

Para Kelly, um dos principais fatores que influenciam na perpetuação desse tipo de crime é a impunidade.

No Brasil, nunca houve condenação por racismo, cuja pena varia de três a cinco anos de prisão, sem a possibilidade de fiança e de prescrição. As condenações por injúria racial, no entanto, são mais frequentes, e têm como punições multa e prisão de um a seis meses.

De acordo com o Código Penal brasileiro, o crime de injúria consiste na conduta de ofender a dignidade de alguém, enquanto racismo é um crime de discriminação dirigida a determinado grupo ou coletividade.

"Quem sofre não pode se calar. Precisamos cobrar mais os órgãos, como a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), os políticos, o Judiciário. É preciso cobrança de todos os lados. É um crime que se espalha por todos os lados, com os negros, com determinadas religiões. Infelizmente, eu não sou a primeira vítima e nem vou ser a última", lamenta.

Secretaria

Em nota divulgada no dia da ocorrência, a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública de Minas afirmou que os supostos crimes ocorreram fora do sistema prisional. A pasta declarou que não compactua com desvios de conduta e que o caso será apurado, observando o amplo direito a defesa.