Por Itasat
Cinco anos após o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, na região Central de Minas, milhares de atingidos ainda lutam por direitos. Entre eles, o de reassentamento, como é o caso dos moradores das comunidades de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, duas das mais atingidas com a tragédia, ocorrida em 5 de novembro de 2015. As obras convivem com sucessíveis atraso e reclamações quanto ao andamento e escolhas no processo.
A entidade criada para gerir os danos causados pelo desastre em acordo que envolveu os governos federal e estaduais de Minas e Espirito Santo, a Samarco e as acionistas Vale e anglo-australiana BHP Billiton, a Fundação Renova é a responsável pelo processo de construção dos novos lares dos moradores de Mariana que não tiveram que abandonar as próprias causas por causa do mar de lama que atingiu as comunidades.
Ex-morador de Bento Rodrigues, o pedreiro e agricultor Expedito Lucas da Silva, conhecido como Caé, avalia: “Eles (Fundação Renova) ouvem tudo o que a gente precisa, necessita, para fazer o contrário. Ela vai fazer o contrário para a sociedade ficar nas mãos dela. É um domínio total essas mineradoras na nossa região aqui”, diz.
Vice-presidente da Associação de Moradores do distrito, Mauro Marcos da Silva discorda sobre posicionamentos de que o processo é participativo. “A participação só foi conquistada por meio de ações do Ministério Público e justamente para corrigir os erros, que eu digo propositais, que a Fundação Renova vem cometendo. Quando é de interesse, ela busca participação dos atingidos. Quando não, ela faz por conta própria, e quando a gente percebe que está errado e aciona o Ministério Público, ela pede a participação para corrigir”, diz.
A avaliação do promotor de Justiça Guilherme de Sá Meneghin, da Comarca de Mariana, carimba as reclamações: “A expressão dos atingidos é muito feliz em dizer que são ouvidos, mas não são escutados. Porque muitas vezes ela (Fundação Renova) colhe as informações, as opiniões, mas não implementa. Reiteradamente, o Ministério Público tem que exigir da Renova a adoção dessas medidas concretamente”, diz.
Diante de tantas reclamações, a pergunta se torna inevitável: a fundação renova foi um erro? Para o prefeito de Mariana, Duarte Júnior, a cidade não teve escolha. Ele garante que como gestor municipal fez tudo que podia e a Fundação Renova é a única responsável por centenas de famílias ainda não estão em casa cinco anos depois da tragédia.
“Isso eu tenho muita convicção e tranquilidade, porque quando o acordo foi assinado, em que o município não foi ouvido, se delimitou como seria feito, através de uma fundação. E essa fundação então assume sua responsabilidade. O que a gente podia fazer a gente fez. A execução, a responsabilidade e as críticas que recaem sobre a fundação, ela precisa ouvir, digerir e melhorar. A responsabilidade é única e exclusiva da Fundação”, diz.
“Se tivesse repassado o recurso para o Poder Público nós estaríamos aqui explicando por que foi mais ágil ou por que não aconteceu no tempo que era determinado. Essa responsabilidade não é do poder público, ela é única exclusivamente da Fundação Renova, de marcar prazo e não entregar na data combinada”, completa.
Para o promotor Guilherme de Sá Meneghin, a criação da Fundação Renova para cuidar da reparação juntos aos atingidos não pode ser classificada como um erro, e sim uma estratégia das mineradoras que causaram o desastre:
“Eu nem qualificaria como erro. Foi uma estratégia adotada pelas empresas que contou com a colaboração direta do Poder Executivo federal, no sentido de que eles fizeram um acordo sem a participação dos municípios, do Ministério Púbico e, sobretudo, sem a participação dos atingidos. Este acordo atendeu exclusivamente interesse das empresas. Hoje eu não tenho dúvidas que foi propositalmente feito. Todo contexto de criação da Fundação Renova demonstra esse propósito de se criar uma entidade que vai tentar limpar a lama das empresas e tentar constituir uma barreira de concretização dos direitos que foram violados neste crime”, avalia.
Diante de um cenário em que não se sentem escutados pela Renova, os atingidos se apegam a entidades como a Fundação Cáritas, que presta assistência técnica pra tentar garantir a participação ampla nos processos decisórios.
O que diz a Renova
A Fundação Renova afirmou que o local onde está sendo construído o Novo Bento foi escolhido pela comunidade. A escolha e definição do desenho urbano foi feita através de processo participativo, com realização de 23 oficinas com 499 participantes da comunidade de Bento Rodrigues. Nessas oficinas, foram recolhidos 1.873 registros. Além disso, o processo contou com reuniões deliberativas conduzidas pela Comissão de Atingidos e sua assessoria técnica para análise do resultado das oficinas e definição do desenho final. O poder público também participou do processo.