Por Itasat
A família do refugiado congolês Moïse Kabagambe, espancado até a morte aos 24 anos na orla da Barra da Tijuca, na zona oeste do Rio, poderá assumir a gestão do quiosque onde ocorreu o crime. A oferta foi feita no início da manhã de sábado (5), pela Secretaria de Fazenda e Planejamento da prefeitura carioca, responsável pela concessão da operação dos quiosques para a empresa Orla Rio.
O prefeito Eduardo Paes (PSD) foi às redes sociais reforçar a iniciativa: “a família passa a ser a nova concessionária do Quiosque! Não à banalização da barbárie!”, escreveu em sua conta no Twitter.
O presidente da Comissão de Direitos Humanos e Assistência Judiciária da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio (OAB-RJ), Álvaro Quintão, que atua no apoio jurídico à família de Moïse, informou que os familiares da vítima veem a proposta com bons olhos e deverão aceitá-la.
A ideia de oferecer a operação do quiosque aos familiares de Moïse veio junto de um projeto de transformar dois quiosques “em um memorial em homenagem à cultura congolesa e africana”.
A iniciativa foi divulgada à imprensa acompanhada de imagens de croquis de como os quiosques poderão ficar, decorados com temas gráficos de inspiração africana. Segundo Quintão, familiares de Moïse receberam um telefonema informando sobre a proposta praticamente ao mesmo tempo.
O projeto, segundo a Secretaria municipal de Fazenda e Planejamento, foi elaborado em parceria com a Orla Rio, que administra todos os quiosques dos calçadões da orla da capital fluminense.
A proposta inclui a reforma dos quiosques Tropicália e Biruta, que dividem a mesma estrutura física, além de apoio e capacitação para a gestão de bares e restaurantes, com auxílio do Senac e entidades dedicadas ao acolhimento de refugiados, disse o secretário de Fazenda e Planejamento do Rio, Pedro Paulo.
O crime ocorreu no Tropicália, que será oferecido à família de Moïse, mas o complexo cultural incluirá também o quiosque vizinho, a ser gerido por outro empreendedor – possivelmente uma organização da sociedade civil, disse Pedro Paulo.
A concessionária Orla Rio administra 309 quiosques espalhados por 34 quilômetros de praias, nas zonas sul e oeste. A concessão começou em 1999 e vai até 2030, após ser renovada, informou a secretaria.
A empresa cuida da manutenção e de obras de melhoria, explorando a publicidade exibida nos espaços. Os estabelecimentos administrados pela concessionária podem ser alugados para comerciantes, que prestam os serviços aos clientes finais.
O assassinato chamou a atenção para possíveis problemas na administração dos quiosques. Segundo a família de Moïse, o crime que ocorreu no último dia 24, teria entre suas motivações o fato de o jovem ter ido ao quiosque cobrar o pagamento de diárias atrasadas por seu trabalho – o congolês trabalhava informalmente como atendente; tanto os suspeitos pelo crime quanto os donos do estabelecimento negam qualquer dívida com a vítima.
O Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro (MPT-RJ) abriu inquérito civil para apurar as condições de trabalho a que era submetido Moïse. A Orla Rio informou que o locatário de um dos quiosques concedeu de forma ilegal a administração do estabelecimento a um cabo da Polícia Militar (PM) e, por isso, a concessionária move um processo para a reintegração de posse do quiosque. Segundo ela, as irregularidades envolvem também a não comprovação da regularização dos funcionários, desrespeito a regras sanitárias e inadimplência.
Pedro Paulo lembrou que não cabe ao poder municipal fiscalizar relações trabalhistas, nem mesmo no âmbito do contrato de concessão com a Orla Rio. Segundo o secretário, a concessão pressupõe que a empresa cuide da manutenção dos quiosques, mas a prefeitura não tem responsabilidade sobre a seleção dos inquilinos.
Os comerciantes que alugam os espaços são responsáveis pela contratação de funcionários. E a fiscalização do cumprimento de normas trabalhistas cabe às Delegacias do Trabalho do governo federal, lembrou Pedro Paulo. À prefeitura cabe a emissão de alvará de funcionamento, a fiscalização do uso do estabelecimento conforme a com destinação autorizada e a verificação de vigilância sanitária, como em todos os bares e restaurantes.
Pedro Paulo reconheceu que a administração dos quiosques da orla é complexa. “No dia a dia com a Orla Rio, temos lá nossos momentos de altos e baixos, mas, na média, a empresa tem administrado essa complexidade que são os quiosques da orla”, afirmou o secretário, frisando que, “a princípio”, nada desabona a Orla Rio na condução da concessão.
“A principio, eles têm respeitado o que reza o contrato, inclusive na regularização de pagamentos a prefeitura”, disse Pedro Paulo. O secretário ressaltou que a prefeitura continuará “fazendo a fiscalização” do contrato da concessão, mas descartou a necessidade de reforços por causa de eventuais irregularidades trabalhistas.