Por Itasat
Segundo o Ministério Público de Minas Gerais, mais de 400 mil inquéritos contra crimes de trânsito estão parados no estado. Desses, 110.747 foram instaurados em 2021 e 58.088 em 2020. Os dados são apresentados no segundo episódio da série da Itatiaia sobre crimes no trânsito.
O promotor de Justiça Marcos Paulo Miranda, coordenador das promotorias criminais de Minas, avalia que a obtenção de provas em crimes de trânsito é complexa, especialmente as que envolvem embriaguez ao volante. “Ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo. Quase sempre a polícia precisa trabalhar com provas testemunhais, contribuindo para a prescrição de muitos inquéritos”, afirma.
Ele explica, por exemplo, as dificuldades de indiciar por homicídio doloso. “O dolo é a deliberada vontade, ou, pelo menos, assumir da produção aquele resultado. É difícil de extrair sem provas robustas. Na maioria das vezes, as investigações que chegam ao Ministério Público são desprovidas de laudos periciais, de imagens da cena do crime”, prossegue.
Segundo o promotor, crimes de trânsito que envolvem condução de veículo após uso de álcool e outros entorpecentes, ficam em um “limbo”. “Não são considerados crimes de menor potencial ofensivo, mas, ao mesmo tempo, não se inserem nos crimes tratados com maior prioridade pelo estado, como tráficos de drogas, homicídios e roubos”, pontua.
“Não rara as vezes trabalhamos com prescrição e necessidade de arquivamento por ausência, por exemplo, de provas periciais que comprovem a embriaguez ao volante”, avalia.
Impunidade
Esse conjunto de fatores, somado ao tempo para ocorrer o julgamento, ocasiona em impunidade, destaca o promotor. “Em razão desse lapso temporal, as testemunhas já não se recordam mais em juízo de como os fatos se deram e isso gera uma impunidade muito grande. Não há condenações”, destaca.
“A partir do momento que as pessoas percebem que a Justiça funciona, que tem condenação, efeitos, isso tende a inibir novas práticas", completa.
Legislação falha
O desembargador Vanderlei de Paiva, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, ressalta que a Legislação atual é falha. "Se o cidadão está embriagado e atropelou uma pessoa, esse crime, ao meu ver, é do dolo eventual. Eu não quero aquele resultado. Mas se embriaguei [e dirigi], estou assumindo o risco de produzir o resultado. E aí o homicídio não é mais culposo", afirma.
"Sendo doloso, a pena mínima é de seis anos, em regime semiaberto. A Legislação, no entanto, às vezes é falha. Se o cidadão é primário, possui bons antecedentes, tem atividade lícita e residência fixa, o princípio do estado democrático de direito é que ele pode responder em liberdade", prossegue.
"E aí caímos em outro problema. Quando o réu está preso, o juiz tem prazo para formação da culpa. Se o réu está solto, não há esse prazo", destaca. Como solução para dar mais celeridade aos processos, o desembargador sugere criar uma vara específica para julgar crimes de trânsito.