No momento em que o governo tenta fechar um acordo com o Congresso Nacional para viabilizar o Orçamento de 2020, ficou mais próximo o risco de parlamentares acionarem uma pauta-bomba com impacto direto nas contas públicas. O rastilho de pólvora que preocupa a equipe econômica leva a um dos temas mais sensíveis para o Palácio do Planalto: a política de valorização do salário mínimo.
O jornal O Estado de S. Paulo apurou que o Congresso quer acelerar essa discussão nas próximas semanas. Fontes do governo informaram que a equipe econômica já procurou lideranças do Senado e da Câmara dos Deputados para "segurar" esse avanço que vem em várias frentes das duas Casas.
A principal delas se dá por meio de emendas que miram a Medida Provisória (MP) 919, que fixou o valor do salário mínimo em R$ 1.045,00 para 2020.
Um projeto de lei do senador Eduardo Braga (MDB-AM) fixa uma nova política para o mínimo. Pelo projeto, os reajustes para a preservação do poder aquisitivo do salário devem refletir a expectativa de inflação anual contida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) mais a taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) per capita, apurada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Há uma articulação para esse projeto ser analisado já na próxima semana na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado.
Braga, que é líder do MDB, também é autor de uma emenda à MP 919 que estabelece uma nova política que garante aumento real do salário mínimo até 2023. A proposta assegura a reposição das perdas inflacionárias acrescida da variação positiva do PIB per capita dos 24 meses que antecedam o reajuste.
Segundo Braga, não haverá crescimento econômico sem aumento de consumo e não haverá aumento de consumo sem uma política de valorização do salário mínimo.
Há outras ideias em pauta. O presidente do partido Solidariedade, deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força, também apresentou um emenda à MP 919, com uma proposta de valorização que altera a correção neste ano. "Se a MP vale desde já, a mudança na política tem de valer para este ano também", afirmou.
O parlamentar informou que discutirá na próxima semana a possibilidade de aprovar a emenda na MP. "Não fiz o cálculo do impacto, mas sei que é importante para os trabalhadores manter uma política de aumento de salário mínimo", disse. Ele ressaltou que o país passou muitos anos com um salário mínimo vergonhoso, em torno de US$ 55, e que para elevar o valor ao patamar atual "deu muito trabalho".
"Por isso, é importante termos uma política de aumento real do salário mínimo, que é um jeito de distribuir renda no Brasil. Há mais de 40 milhões de pessoas que vivem disso", ponderou Paulinho.
Impacto
Para um integrante da equipe econômica, a discussão da política do salário mínimo não é só de custo fiscal, mas também de impacto no emprego. O diagnóstico do Ministério da Economia é que, se elevar o salário mínimo com o atual nível de desemprego, haverá dificuldade de geração de postos formais, jogando os trabalhadores na informalidade, como já tem ocorrido no Nordeste.
A preocupação com pautas-bomba entrou no radar com o acirramento dos ânimos com o Parlamento após o presidente Jair Bolsonaro disparar um vídeo convocando apoiadores a irem às ruas para defendê-lo contra o Congresso. O episódio ajudou a colocar a pauta do governo em suspense e ampliou as incertezas em relação à agenda econômica.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, é o mais cobrado pelas lideranças partidárias da Câmara e do Senado, que o acusam de descumprir o acordo do Orçamento impositivo, que amplia poderes dos parlamentares na destinação dos recursos para programas e ações do governo.
A política de valorização do mínimo terminou no ano passado. Ela considerava o reajuste pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) mais o PIB de dois anos anteriores. Para 2020, a proposta é apenas a reposição da inflação medida pelo INPC, sem aumento real.