Uma mulher, que contraiu infecção hospitalar após o parto, deverá ser indenizada em R$ 50 mil pelos danos morais e em R$ 50 mil por danos estéticos pela Fundação São Francisco Xavier, gestora do hospital onde foi atendida.
A paciente deve receber também pensão mensal no valor de um salário mínimo até a data em que durar sua incapacidade para o trabalho. Também deverão ser custeados os tratamentos e cirurgias necessárias. A decisão é da 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG).
Para o TJMG, a paciente foi indevidamente exposta aos efeitos nocivos de um serviço de saúde deficiente, que afetou, de forma inexorável, o seu patrimônio moral, em um momento de fragilidade extrema (estado puerperal).
Relatam os autos que, em 21 de novembro de 2015, na Comarca de Ipatinga, a gestante deu entrada no hospital gerido pela fundação, sentindo contrações. Durante o parto normal, foi realizada a manobra de “Mcroberts”, devido à “distócia de ombro”, o que causou “laceração em fúrcula vaginal, grau III, e pára-uretral bilateralmente. A alta hospitalar foi concedida no dia seguinte.
A paciente alegou que, em 24 de novembro, precisou retornar ao hospital, em razão de febre alta e fraqueza intensa, sendo diagnosticada com um quadro de sepse, que, posteriormente, evoluiu para a forma grave dessa patologia.
Esclareceu que, nessa nova internação, surgiu um “buraco” na parede abdominal, de aproximadamente oito centímetros de comprimento. Menciona que foi submetida a duas cirurgias, ficando 35 dias internada em UTI, e, mesmo após ter retornado para casa, continuou acamada, porque as feridas não cicatrizaram.
Ressaltou que toda essa situação lhe causou sérios danos, uma vez que ficou impossibilitada de amamentar e ter contato com a sua filha recém-nascida, além de não ter condições de exercer a sua vida laborativa.
Em primeira instância, a fundação foi condenada a pagar pensão mensal no valor correspondente a 1 salário mínimo até a data em que durar a incapacidade da autora para o trabalho, danos morais no valor de R$ 25 mil e danos estéticos também no valor R$ 25 mil.
A fundação foi condenada ainda à obrigação de realizar as cirurgias necessárias ao pleno restabelecimento físico/estético da autora e, na hipótese de se mostrar inviável o cumprimento da obrigação, na obrigação de custear a realização por outro estabelecimento/profissional.
Ambas as partes recorreram. A fundação afirmou ter ficado comprovada a inexistência de defeito na assistência prestada à autora, e que todos os procedimentos adotados estão dentro dos ditames da literatura médica.
Argumentou que, quando da alta médica, a paciente foi adequadamente alertada sobre os cuidados com a higiene. Anotou que essa patologia de trato genital no pós-parto, que ascendeu ao abdome inferior, pela contaminação por fezes presentes no local da cirurgia, contribuiu para a proliferação de bactérias no organismo da paciente e a consequente sepse grave, inexistindo incorreções nos procedimentos adotados pelos seus prepostos.
Alegou ausência de nexo de causalidade entre a conduta de seus prepostos e os danos sofridos pela paciente.
Caso as condenações sejam mantidas, requereu a redução das quantias arbitradas e a alteração do termo inicial dos juros de mora.
A paciente também recorreu pedindo a majoração do valor fixado para os danos morais e estéticos.
Em seu voto, o relator, desembargador Roberto Vasconcellos, observou que, ao contrário do defendido pela fundação, o conjunto probatório indica que a paciente foi acometida por infecção hospitalar, não havendo ela contribuído para o desenvolvimento da sepse.
Ele afirmou que, estando a infecção relacionada ao procedimento médico ao qual a paciente foi submetida (parto) e havendo a patologia se manifestado logo após a alta (dois dias depois), a situação se encaixa perfeitamente no conceito de “infecção hospitalar”.
O desembargador citou ainda o laudo pericial no qual foi atestado que o “Staphylococcus haemolyticus“, embora faça parte da flora dos seres humanos, “é considerado um importante patógeno nosocomial”.
O magistrado registrou que não há nada nos autos que comprove a alegada falta de assepsia da paciente, que, aliás, em depoimento pessoal, foi firme ao informar que utilizou os medicamentos prescritos, bem como teve a ajuda de seu companheiro para tomar banho, além de realizar a higiene necessária, por conta das lacerações.
Mesmo que a perita tenha atestado que as condutas dos profissionais foram corretas, está presente o nexo de causalidade entre o serviço e o dano, uma vez que a prova técnica e a informação de testemunha indicam que a patologia da autora decorreu de infecção desenvolvida em lesão decorrente do parto a que foi submetida naquele hospital.
Quanto ao pagamento de pensão mensal para a paciente, o relator entendeu ser devido enquanto durar a incapacidade laborativa da mesma, no valor de um salário mínimo, quantia que ela recebia como empregada doméstica. Também devem ser custeados pela fundação as cirurgias e tratamentos necessários.
Em relação aos danos estéticos, o relator majorou o valor para R$ 50 mil, estando esse montante condizente com os parâmetros jurisprudenciais. Também aumentou para R$ 50 mil o valor referente aos danos morais.
O relator observou que em razão das sequelas, a paciente tem convivido com dor perianal constante, entre outros desconfortos, situações que maculam gravemente o patrimônio imaterial, tendo em vista os constrangimentos que delas decorrem.
Dessa forma, deu provimento ao recurso da paciente. Quanto ao recurso da fundação, acolheu-o somente para alterar o termo inicial dos juros de mora.
Acompanharam o relator os desembargadores Luciano Pinto e Evandro Lopes da Costa Teixeira.